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segunda-feira, 12 de setembro de 2016

A Casa do Pedágio - W.W. Jacobs (Parte 3)


Ele olhou rapidamente para a porta. "Pensei ter ouvido alguém", disse, com uma risada envergonhada. "Agora, Lester,vamos subir com ele. Um, dois... Lester! Lester!"

Ele saltou para a frente tarde demais; Lester, com o rosto enterrado em seus braços, rolou no chão, dormindo, e mesmo seus maiores esforços não conseguiram despertá-lo.

"Ele... dormiu", gaguejou. "Dormiu!"

Barnes, que pegara a vela da lareira, ficou olhando para os que dormiam em silêncio, a cera da vela pingando sobre o chão.

"Temos de sair daqui", disse Meagle. "Rápido!"

Barnes hesitou. "Nós não podemos deixá-los aqui..." começou.

"Nós devemos," disse Meagle, em voz estridente. "Se você dormir, eu também...  Rápido! Vamos!"

Ele agarrou o outro pelo braço e se esforçou para arrastá-lo até a porta. Barnes livrou-se dele, e, colocando a vela em cima da lareira, tentou novamente acordar os adormecidos.

"Isso não é bom", disse ele por fim, e, voltando-se a para Meagle. "Você não vai dormir!", disse ele, ansioso.

Meagle sacudiu a cabeça, e puseram-se por algum tempo em silêncio desconfortável. "Devíamos fechar a porta", disse Barnes, finalmente.

Ele cruzou a sala e fechou-a suavemente. Então, após um ruído atrás de si, virou-se e viu Meagle escorado na lareira.


Com uma parada brusca na respiração, ele ficou imóvel. Dentro da sala a vela, com sua luz bruxuleante, mostrou as posições grotescas dos adormecidos. Além da porta sua imaginação parecia revelar uma estranha e furtiva agitação. Ele tentou assobiar, mas seus lábios estavam ressecados, e de forma mecânica inclinou-se e começou a pegar as cartas espalhadas pelo chão.

Parou uma ou duas vezes e ficou com a cabeça inclinada, escutando. A agitação do lado de fora parecia aumentar; um rangido alto soou das escadas.

"Quem está aí?" ele gritou em voz alta.

O ranger cessou. Ele foi até a porta, e, abrindo-a, saiu para o corredor. Enquanto caminhava seus medos o abandonaram de repente.

"Vamos!" ele gritou, com uma risada baixa. "! Todos vocês! Mostrem seus rostos - suas caras feias e infernais! Parem de se esconder!"


Ele riu novamente e avançou; colocou a cabeça para fora como uma tartaruga e ouviu com horror passos se afastando. Quando eles se tornaram inaudíveis na distância, relaxou.

"Bom Deus, Lester, nós o enlouquecemos", disse ele, em um sussurro assustado. "Nós temos que ir atrás dele."

Não houve resposta. Meagle ficou de pé.

"Você escutou?" ele chorou. "Pare de enganar agora, isso é sério. White! Lester! Vocês ouvem!?"

Ele se inclinou e examinou-os com raiva. "Tudo bem", disse ele, com a voz trêmula. "Não vão me assustar, sabiam?"

Ele virou-se e andou com despreocupação exagerado na direção da porta. Foi para fora e olhou pela fresta, mas os adormecidos não se moveram. Ele olhou para a escuridão atrás, e voltou correndo para a sala novamente.

Permaneceu parado por alguns segundos sobre eles, escutando. O silêncio na casa era horrível; ele não poderia mesmo ouvi-los respirar. Com uma resolução repentina, ele pegou a vela da lareira e manteve a chama no dedo de White. Cambaleou para trás estupefato e os passos tornaram-se novamente audíveis.

Ficou com a vela na mão tremendo, escutando. Ouviu-os subir a escada mais longe, mas pararam de repente quando ele foi até a porta. Caminhou um pouco ao longo da passagem e os passos saíram correndo pelas escadas, seguidos por um desbalada carreira no corredor abaixo. Voltou para a escada principal, e cessaram novamente.

Por um tempo, ficou parado perto dos balaústres, ouvindo e tentando enxergar algo na escuridão abaixo; em seguida, lentamente, passo a passo, ele caminhou até o térreo, e, segurando a vela acima da cabeça, olhou o local.

"Barnes!" ele chamou. "Onde está voce?"

Tremendo de medo, ele caminhou ao longo da passagem, e reunindo toda a sua coragem, empurrou as portas e olhou temerosamente as salas vazias. Então, de repente, ele ouviu os passos na frente dele.


Seguiu lentamente com medo de que a vela se apagasse, até que chegou, finalmente, a uma vasta cozinha nua, com paredes úmidas e um piso quebrado. Na frente dele uma porta que dava para um quarto interior tinha acabado de se fechar. Correu em direção a ela e abriu e um ar frio apagou a vela. Ficou horrorizado.

"Barnes!" ele gritou novamente. "Não tenha medo É...  Meagle"

Não houve resposta. Ficou encarando a escuridão com a impressão de que algo por perto o observava. Então, de repente os passos eclodiram em cima novamente.
Recuou às pressas, e, passando pela cozinha, tateou seu caminho ao longo das passagens estreitas. Agora ele podia ver melhor na escuridão, e encontrando-se, por fim, ao pé da escada, começou a subir sem fazer barulho. Chegou ao patamar bem a tempo de ver uma figura desaparecer em uma esquina. Ainda com o cuidado de não fazer nenhum ruído, seguiu o som dos passos até chegar ao andar superior e encurralou o perseguido no final de uma curta passagem.

"Barnes!" ele sussurrou. "Barnes!"

Algo se agitou na escuridão. Uma pequena janela circular no final da passagem amenizou a escuridão e revelou os contornos sombrios de uma figura imóvel. Meagle, em vez de avançar permaneceu imóvel enquanto uma súbita e horrível dúvida se apossou dele. Com os olhos fixos na forma em frente, afastou-se lentamente. A forma avançou sobre ele, que explodiu em um grito terrível.

"Barnes! Pelo amor de Deus! É você?"

O eco de sua voz estremeceu o ar, mas a figura diante dele não prestou atenção. Por um momento  tentou preparar a sua coragem para enfrentar a aproximação mas, em seguida, com um grito sufocado, virou-se e fugiu.

As passagens abriam-se como um labirinto e ele correu às cegas procurando, em vão, as escadas. Se ele pudesse descer e abrir a porta do salão...

Prendeu a respiração em um soluço; os passos tinha recomeçado. Em um trote desajeitado eles ecoavam em cima e embaixo, nas passagens nuas, dentro e fora como se estivesse em busca dele. Entrou em uma pequena sala e ficou atrás da porta esperando. Então saiu e correu rapidamente, procurando não fazer ruído, na direção oposta. Os passos o seguiram. Encontrou o longo corredor e correu ao longo dele em o mais rápido que podia. Sabia que as escadas estavam no final e, com os soando nos seus calcanhares, desceu às cegas. Os passos o alcançaram e ele jogou-se para o lado,  deixando-os passar, ainda continuando sua fuga precipitada. Então, de repente, ele sentiu-se deslizar  no espaço.
Lester acordou de manhã para encontrar a luz do sol fluindo para dentro do quarto, e White sentado e olhando com certa perplexidade para um dedo queimado.

"Onde estão os outros?" perguntou Lester.

"Se foram, eu suponho", disse White. "Devemos ter dormido."

Lester se levantou, e, esticando suas pernas enrijecidas, tirou a poeira de suas roupas e saiu para o corredor. White o seguiu. Ao som de sua aproximação, uma figura que estava dormindo na outra extremidade sentou-se e revelou o rosto de Barnes. "Por que eu dormi?", ele disse, com surpresa. "Eu não me lembro de vir aqui. Como cheguei aqui?"

"Belo lugar para uma sesta", disse Lester severamente, enquanto apontava para a abertura nos balaústres. "Olha lá! Outro lugar onde você poderia ter estado?"

Ele caminhou descuidadamente até a borda e olhou para baixo. Em resposta ao seu grito assustado os outros aproximaram-se, e todos os três ficaram olhando para o homem morto logo abaixo.


FIM

sexta-feira, 9 de setembro de 2016

A Casa do Pedágio - W.W. Jacobs (Parte 2)

II

"Parece dureza termos que perder uma noite de descanso para convencer Barnes que fantasmas existem", disse White.

"É por uma boa causa", disse Meagle. "Um objetivo digno e acho que vamos ter sucesso Você trouxe as velas, Lester.?"

"Eu trouxe duas", foi a resposta; "tudo do que o velho tinha."

A luz do luar era fraca e o céu estava coberto de nuvens. A estrada que seguia entre sebes altas estava escura e em certa parte, onde ela cruzava a floresta, eles tropeçaram ao menos duas vezes.

"Deixamos nossas camas confortáveis ​​para isso!" disse White novamente. "Deixe-me ver, o sepulcro residencial desejável está para a direita, não é?"

"Mais adiante", disse Meagle.

Eles andaram por algum tempo em silêncio, quebrado apenas pelo tributo de White para a suavidade, a limpeza e o conforto da cama que foi afastado cada vez mais. Sob a orientação de Meagle eles viraram à direita, e, depois de uma caminhada de aproximadamente 400 metros, viram as portas da casa diante deles.

A casa estava parcialmente escondida atrás de arbustos e a estrada estava sufocada com galhos crescidos. Com Meagle a frente, eles empurraram os galhos até que os pilares negros da casa surgiram diante deles.

"Há uma janela na parte de trás, por onde podemos entrar, segundo o proprietário", disse Lester, quando eles pararam diante da porta.

"Janela?" disse Meagle. "Bobagem. Vamos fazer isso direito. Onde está?"

Tateou pela escuridão e começou a sacudir a porta, trovejando na escuridão.

"Não banque o tolo", disse Barnes, irritado.

"Os criados fantasmas estão todos dormindo", disse Meagle gravemente, "mas eu vou acordá-los antes de acabar com eles. É um absurdo nos deixar aqui no escuro."

Ele sacudia a maçaneta de novo, e o barulho ecoava no vazio da casa. Em seguida, com uma exclamação, ele estendeu as mãos e tropeçou para a frente.

"Estava aberta o tempo todo", disse ele, com um som estranho na sua voz. "Vamos."

"Eu não acredito que estava aberta", disse Lester, parado na retaguarda do grupo. "Alguém está nos pregando uma peça."

"Bobagem", disse Meagle bruscamente. "Me dê uma vela. Obrigado. Quem tem um fósforo?"

Barnes riscou e acendeu a vela, e Meagle, protegendo a vela com a mão, abriu caminho até o pé da escada. "Alguém feche a porta", disse ele; "Está ventando muito."

"Ele está fechada", disse White, olhando atrás dele.

Meagle coçou o queixo. "Quem fechou?" Ele perguntou, olhando de um para o outro. "Quem passou por último?"

"Fui eu", disse Lester, "mas não lembro de ter fechado... Talvez eu tenha."
Meagle ia dizer algo mas pensou melhor, e, ainda protegendo a chama, começou a explorar a casa, com os outros logo atrás. Sombras dançavam nas paredes e escondiam os cantos conforme eles passaram. No final da passagem eles encontraram uma segunda escada, e subiram  lentamente para o primeiro andar.

"Cuidado!" disse Meagle, conforme os outros chegavam.

Ele segurou a vela a frente e mostrou onde os balaústres tinham rompido. Então olhou com curiosidade para o vazio embaixo.

"Este é o lugar onde o vagabundo se enforcou, eu acho", disse ele, pensativo.

"Você tem uma mente doentia", disse White, enquanto andavam. "Este lugar é assustador o suficiente sem você lembrar isso. Agora vamos encontrar um quarto confortável, tomar um pouco de whiskey e fumar nossos cachimbos. Pode ser?"

Ele abriu uma porta no final da passagem e revelou uma pequena sala quadrada. Meagle foi a frente com sua vela, e, derramando algumas gotas de cera, prendeu-a em cima da lareira. Os outros sentaram-se no chão e assistiram White tirar do bolso uma pequena garrafa de uísque e um copo de lata.

"Hum! Esqueci a água!"

"Logo vai ter alguma", disse Meagle.

Ele puxou violentamente um cordão suspenso e o tilintar enferrujado de um sino soou em uma cozinha distante. Ele tocou novamente.

"Não banque o tolo", disse Barnes aproximando-se.

Meagle riu. "Eu só queria convencê-lo", disse ele gentilmente. "Deve haver, pelo menos, um fantasma na sala dos criados."

Barnes levantou a mão pedindo silêncio.

"Sim?" disse Meagle, com um sorriso para os outros dois. "Tem alguém vindo?"

"Suponha que nós deixamos isso pra lá e voltemos", disse Barnes de repente. "Eu não acredito em espíritos, mas os ninguém controla totalmente seus nervos. Fique a vontade pra rir, mas juro que ouvi uma porta aberta abaixo e passos na escada."

Sua voz foi afogado em uma gargalhada.

"Lá vem ele", disse Meagle, com um sorriso. "Quando eu terminar, ele vai ser um crente completo.

Bem, quem vai pegar um pouco de água? Será que, você, Barnes?"

"Não", foi a resposta.

"Se houver alguma, pode não estar boa para beber depois de todos esses anos", disse Lester. "Nós temos que fazer sem ela."
 
Meagle assentiu, e sentando no chão, estendeu a mão para o copo. Cachimbos foram acesas, e o cheiro limpo, saudável de tabaco encheu a sala. White produziu um baralho de cartas; o som de vozes e risos ecoaram pela sala e morreu na relutância em corredores distantes.

"Quartos vazios sempre me fazem acreditar que eu possuo uma voz profunda", disse Meagle.

"Amanhã eu..."

Ele começou com uma exclamação sufocada quando a luz se apagou de repente e algo o atingiu na cabeça. Os outros saltaram. Então Meagle riu.

"É só a vela", ele exclamou. "Eu não a prendi bem."

Barnes riscou um fósforo, e tornou a acender a vela, prendeu-a em cima da lareira, e sentando-se, pegou suas cartas novamente.

"O que eu ia dizer?" disse Meagle. "Oh, eu sei, para amanhã ..."

"Escutem!" disse White, segurando o outro pela manda. "Palavra de honra que eu realmente pensei ter ouvido uma risada."

"Olhe aqui!" Barnes disse. "O que você disse sobre voltar? Eu já estou farto disso! Eu estou imaginando coisas também? Sons de algo se movendo na passagem lá fora... eu sei que é apenas fantasia, mas é desconfortável."

"Você vai se você quiser", disse Meagle, "e nós jogar dummy*. Você pode pedir pro vagabundo segurar sua mão quando for descer."

Barnes estremeceu e soltou uma exclamação com raiva. Levantou-se, e, caminhando para a porta entreaberta, escutou.

"Vá lá fora", disse Meagle, piscando para os outros dois. "Eu te desafio a ir até a porta da sala e voltar sozinho."

Barnes voltou, e, inclinando-se, acendeu o cachimbo na vela.

"Estou nervoso, mas racional", disse ele, soprando uma nuvem fina de fumaça. "Meus nervos me dizer que há algo rondando pra cima e para baixo lá fora; minha razão me diz que isso é tudo bobagem Onde estão as minhas cartas.?"

Sentou-se de novo, e, pegando sua mão, olhou-o cuidadosamente.

"Sua vez, White," ele disse, depois de uma pausa.

White não fez nenhum sinal.

"Ora, ele está dormindo", disse Meagle. "Acorde, velho. Acorde e jogue."

Lester, que estava sentado ao lado dele, pegou o adormecido pelo braço e sacudiu-o, delicadamente no início e depois com mais força, mas White, com as costas contra a parede e a cabeça baixa, não fez nenhum sinal. Meagle gritou em seu ouvido, e depois virou um rosto intrigado com os outros.

"Ele dorme como um morto", disse ele, fazendo uma careta. "Bem, ainda existem três de nós para manter companhia um ao outro."

"Sim", disse Lester, balançando a cabeça. "A menos que... Bom Deus! Suponha..."

Ele parou, e olhou para eles, tremendo.

"Suponha o quê?" perguntou Meagle.

"Nada", gaguejou Lester. "Vamos acordá-lo. Tente outra vez. White! White!"

"Isso não é bom", disse Meagle a sério; "Há algo de errado com esse sono."

"Isso que eu quis dizer", disse Lester; "E se ele vai dormir assim, por que não deveria..."

Meagle saltou de pé. "Bobagem", disse ele asperamente. "Ele está cansado, só isto. Ainda assim, vamos levá-lo para cima. Você pega as pernas e Barnes vai na frente com a vela. Quem é esse...?"



*Dummy - Jogo de cartas


(continua)

terça-feira, 6 de setembro de 2016

A Casa do Pedágio - W.W. Jacobs (Parte 1)


Observação: Apesar do grande interesse em ler esse conto, só o encontrei no seu original (o inglês). 
Sendo assim, publico essa versão traduzida por mim e pelo meu  amigo de todas as horas, o Google.
vocês vão perceber que os diálogos foram modernizados para ficarem mais coloquiais... ainda não decidi se isso é um ponto positivo o negativo.


I

"É tudo besteira!", disse Jack Barnes."Claro que pessoas morreram naquela casa! Pessoas morrem em toda casa. E sobre os tais ruídos... vento na chaminé e ratos na lambris são muito convincentes para um homem nervoso. Me dê outra xícara de chá, Meagle" "

"Lester e White primeiro.", disse Meagle, que estava presidindo a mesa de chá da Pousada Três Penas. "Você já tomou duas."

Lester e White terminaram suas xícaras com uma lentidão irritante, fazendo uma pausa entre goles para sentir o aroma. Meagle serviu-os até a borda, e, em seguida, voltando-se para o Barnes, que esperava sisudo, suavemente solicitou-o para que pedisse mais água quente.

"Vamos tentar manter seus nervos em uma condição saudável", ele comentou. "Falo por mim... tenho uma espécie de crença parcial no sobrenatural."

"Todas as pessoas sensatas têm", disse Lester. "Uma tia minha viu um fantasma uma vez."

White concordou.

"Eu tinha um tio que viu um", disse ele.

"É sempre outra pessoa que os vê", disse Barnes.

"Bem, essa tal casa", disse Meagle, "é uma casa grande com um aluguel absurdamente baixo, e ninguém se arrisca. Tomou como pedágio pelo menos uma vida de cada família que viveu lá -  até os que ficaram pouco tempo - e desde que ficou vazia, zelador depois de zelador morreu por lá. O último morreu há quinze anos. "

"Exatamente", disse Barnes. "Tempo suficiente para as lendas se acumularem."

"Aposto um Soberano você não passa a noite lá sozinho, mesmo com toda a sua conversa", disse White de repente.

"E eu!", disse Lester.

"Não", disse Barnes lentamente. "Eu não acredito em fantasmas nem em quaisquer coisas sobrenaturais, seja lá quais forem. Admito que eu não deveria me importar em passar uma noite lá sozinho."

"Mas por que não?" perguntou Branco.

 "Vento na chaminé", disse Meagle, com um sorriso.

  "Ratos no lambril?", opinou Lester.

  "Como você quiser", disse Barnes, enrubescendo.

"Suponha que todos nós vamos?" disse Meagle. "Vamos depois do jantar, lá pelas onze chegamos lá. Estamos há dez dias sem uma aventura... Exceto a descoberta de Barnes da vala com água. Será uma novidade, de qualquer forma, e se quebrarmos o encanto e todos sobrevivermos, o proprietário pode nos dar algo em agradecimento".

"Vamos ver o que o proprietário tem a dizer sobre isso primeiro", disse Lester. "Não há diversão em passar uma noite em uma casa vazia ordinária. Vamos ter certeza de que é mal-assombrada."

 Tocou a campainha do proprietário e apelou em nome da nossa humanidade comum para que não os deixasse desperdiçar uma noite observando uma casa da qual espectros e duendes não fizessem parte. A resposta foi mais do que reconfortante, e o proprietário, depois de descrever com arte considerável a aparência exata de uma cabeça que tinha sido vista saindo de uma janela sob o luar, acabou com um pedido educado, mas urgente, para que acertassem suas dívidas com ele naquele momento.

"Não há nenhum problema em vocês, jovens cavalheiros, terem o seu divertimento," ele disse com indulgência; "Mas, supondo que você sejam todos encontrados mortos de manhã... e quanto a mim? Ela não é chamada de Casa do Pedágio à toa, sabem?."

 "Quem morreu lá pela última vez?" perguntou Barnes, com um ar de desdém educado.

"Um vagabundo", foi a resposta. "Ele foi para lá por uma aposta de meia-coroa, e eles o encontraram na manhã seguinte pendurado nos balaústres, morto."

  "Suicídio", disse Barnes. "Insanidade mental".

 O proprietário concordou. "Isso foi o que o júri disse", falou ele lentamente; "Mas sua mente era sólida o suficiente quando ele foi lá. Eu o conhecia há anos. Sou um homem pobre, mas eu não iria passar uma noite naquela casa nem por cem libras."

Ele repetiu essa observação quando eles começaram sua expedição algumas horas mais tarde. Saíram na hora em que a Pousada fechava; trovões explodiram ruidosamente atrás deles, e, enquanto os clientes regulares se arrastavam lentamente para a Casa do Pedágio, eles rumaram na direção da casa em ritmo acelerado. A maioria das casas já estavam às escuras e as luzes em outras iam se apagando conforme eles passavam.


(continua)

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Grandes Mestres do Horror - W. W. Jacobs


Em homenagem aos Grandes Mestres do  Horror, vou começar uma série de postagens sobre aqueles que tiraram o sono de muita gente com seus contos sobre Horror, Medo, o Fantástico e o Desconhecido.



W. W. Jacobs
(08/09/1863 - 01º/09/1943)

William Wymark Jacobs

Escritor inglês de contos e romances. Apesar de ter sua produção literária constituir-se principalmente por histórias com um tom mais bem humoradas e que tratam de aventuras de marinheiros (a marca impressionante de 19 volumes de contos sobre esse tema, uau!), sua obra mais famosa, especialmente no Brasil, é o conto chamado "A Pata do Macaco" (no original, The Monkey's Paw), publicado originalmente em uma coletânea de histórias curtas intitulada The Lady of the Barge (1902).

Emblema de Birkbeck
Jacobs nasceu em Wapping, Londres. Seu pai era um gerente de cais em South Devon no Lower East Smithfield. Foi educado em uma escola particular em Londres e mais tarde no Birkbeck College (então chamado Birkbeck Literary and Scientific Institution, agora parte da Universidade de Londres).
Em 1879, Jacobs começou a trabalhar como funcionário dos correios (Post Office Savings Bank). Em 1885 ele teve seu primeiro conto publicado. Seu caminho para o sucesso foi relativamente lento.

Casou-se em 1905 com Agnes Eleanor Williams, uma sufragista (pessoa que defende a extensão dos votos a todos, sem distinção de raça, sexo, poder econômico, origem, etc). Jacobs declarou que embora tivesse opiniões de esquerda na juventude, em seus últimos anos sua posição política era "conservador e individualista".

Sua produção literária diminuiu acentuadamente durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) e o autor passou a se dedicar a adaptar suas obras para o teatro.

Jacobs morreu em Hornsey Lane, Islington, Londres, aos 80 anos.



Duas Obras do Mestre que recomendo:


A Pata do Macado - Uma família tem contato com um amuleto (a pata do macaco) capaz de conceder três desejos à pessoa que o segura.  Entretanto, cada desejo traz consigo consequências não tão agradáveis.

The Toll-House - Quatro homens conversam sobre uma casa supostamente mal assombrada. Para provar que fantasmas não existem, decidem passar a noite no local.

Nota: Toll significa não apenas pedágio, na tradução literal. Também significa: "vítimas, fatalidades, mortos, etc". E take a toll, por sua vez, pode significar "prejudicar, afetar, lesar, vitimar, etc." Nesse sentido, "Toll-House" tem um duplo sentido: Casa de Pedágio e/ou Casa das Fatalidades.
Fonte: http://www.teclasap.com.br/toll-nao-significa-so-pedagio/




Fontes:

https://en.wikipedia.org/wiki/W._W._Jacobs

http://www.letrasperdidas.galeon.com/c_jacobs00.htm


sábado, 13 de agosto de 2016

A Pata do Macaco - W.W. Jacobs (Parte 3)


III


No enorme cemitério novo, a alguns quilômetros de distância, os velhos enterraram seu morto e voltaram para casa mergulhada em sombras e silêncio. Tudo terminara tão rápido que a princípio nem se davam conta do que acontecera, e ficaram num estado de expectativa como se fosse acontecer mais alguma coisa — algo mais que aliviasse esse fardo, pesado demais para corações velhos.



Mas os dias se passaram, e a expectativa deu lugar à resignação — a resignação desesperançada dos velhos, às vezes chamada erradamente de apatia. Algumas vezes nem trocavam uma palavra, pois agora não tinham nada do que falar e os dias eram compridos e desanimados.

Foi por volta de uma semana depois que o velho, acordando subitamente de noite, estendeu o braço e viu-se sozinho. O quarto estava no escuro e o ruído de soluços baixinhos vinha da janela. Ele se levantou na cama e ficou ouvindo.



– Volte para a cama — disse ele ternamente. — Você vai ficar gelada.


– Está mais frio para ele — disse a senhora, e chorou novamente.

O som de seus soluços apagou-se nos ouvidos dele. A cama estava quente, e seus olhos pesados de sono. Ele cochilava a todo instante e acabou pegando no sono, quando um súbito grito histérico da esposa o despertou com um sobressalto.

– A pata! — gritou histericamente. — A pata de macaco!

Ele se levantou, alarmado.

– Onde? Onde está? O que houve?

Ela correu agitada até ele.

– Eu quero a pata — disse ela calmamente. — Você não a destruiu?

– Está na sala, em cima da prateleira — replicou ele atônito. — Por quê?

Ela chorou e riu ao mesmo tempo e, debruçando-se, beijou-o no rosto.

– Só tive essa ideia agora — disse ela histericamente. — Por que não pensei nisso antes? Por que você não pensou nisso antes?


– Pensar em quê? — perguntou ele.

– Nos outros dois desejos — replicou ela rapidamente. — Nós só fizemos um pedido.

– Não foi suficiente? — perguntou ele, irado.

– Não — gritou ela, triunfante; — ainda vamos fazer um.

Desça, apanhe a pata rapidamente, e deseje que o nosso filho viva novamente.

O homem sentou-se na cama e arrancou as cobertas de cima do corpo trêmulo.

– Meu bom Deus, você está louca! Gritou ele, horrorizado.

– Pegue aquela coisa — disse ela, ofegante –, pegue depressa, e faça o pedido… Ah, meu filho, meu filho!
O Marido riscou um fósforo e acendeu a vela.

– Volte para a cama — disse ele, incerto. — Você não sabe o que está dizendo.

– Nós conseguimos satisfazer o primeiro pedido — disse a senhora, febrilmente. — Por que não o segundo?

– Foi uma coincidência — gaguejou o velho.

– Vá buscar a pata e faça o pedido — gritou a esposa, tremendo de excitação.

O velho virou-se, olhou para ela, e sua voz tremeu.

– Ele já está morto há 10 dias e, além disso, ele… — eu não queria lhe dizer isso, mas… só consegui reconhecê–lo pela roupa. Se já estava tão horrível para você ver, imagine agora?

– Traga-o de volta — gritou a senhora, e o arrastou para a porta. — Você acha que tenho medo do filho que criei?



Ele desceu na escuridão, foi tateando até a sala e depois até a lareira. O talismã estava no lugar, e um medo horrível de que o desejo ainda não expresso pudesse trazer o filho mutilado apossou-se dele, e ficou sem ar ao perceber que perdera a direção da porta. Com a testa fria de suor, ele deu volta na mesa, tateando, e foi-se amparando na parede até se achar no corredor com a coisa nociva na mão.


Até o rosto da esposa parecia mudado quando ele entrou no quarto. Estava branco e ansioso, e para seu temor parecia ter um olhar estranho. Ele sentiu medo dela.



– Peça! — gritou ela, com voz forte.


– Isso é loucura — disse ele, com voz trêmula.

– Peça! — repetiu a esposa.

Ele levantou a mão.

– Eu desejo que meu filho viva novamente.

O talismã caiu no chão, e ele olhou para a coisa com medo.

Então afundou numa cadeira, trêmulo, quando a esposa, com os olhos ardentes, foi até a janela e levantou a persiana.

Ficou sentado até ficar arrepiado de frio, olhando ocasionalmente para a figura da velha senhora espiando pela janela.

O cotoco de vela, que queimara até a beirada do castiçal de porcelana, jogava sombras sobre o teto e as paredes, até que, com um bruxulear maior do que os outros, se apagou. O velho, com uma imensa sensação de alívio pelo fracasso do talismã, voltou para a cama, e um ou dois minutos depois a senhora veio silenciosamente para o seu lado.

Nenhum dos dois disse nada, mas permaneceram deitados em silêncio, ouvindo o tique–taque do relógio. Um degrau rangeu, e um rato correu guinchando através do muro. A escuridão era opressiva e, depois de ficar deitado por algum tempo, criando coragem, ele pegou a caixa de fósforos e, acendendo um, foi até embaixo para pegar uma vela.

Nos pés da escada o fósforo se apagou, e ele parou para riscar outro; no mesmo momento ouviu-se uma batida na porta da frente, tão baixa e furtiva que quase não se fazia ouvir.

Os fósforos caíram–lhe da mão e espalharam-se no corredor. Ele permaneceu imóvel, com a respiração presa até a batida se repetir. Então virou-se e fugiu rapidamente para o quarto, fechando a porta atrás de si.
Uma terceira batida ressoou pela casa.

– O que é isso? — gritou a senhora, levantando-se.

– Um rato — disse o velho com voz trêmula –, um rato. Ele passou por mim na escada.

A esposa sentou-se na cama, escutando. Uma batida alta ressoou pela casa.

– É Herbert! — gritou. — É Herbert!

Ela correu até a porta, mas o marido ficou na frente dela e, pegando-a pelo braço, segurou-a com força.
– O que você vai fazer? — sussurrou ele com voz rouca.

– É meu filho; é Herbert! — gritou ela, debatendo-se mecanicamente. — Eu esqueci que ele estava a 10 quilômetros daqui. Por que está me segurando? Me solte. Eu tenho de abrir a porta.

– Pelo amor de Deus não deixe entrar — gritou o velho tremendo.

– Você está com medo do próprio filho — gritou ela, debatendo-se. — Me solte. Eu já vou, Herbert; eu já vou.

Ouviu-se mais uma batida, e mais outra. A senhora com um arrancão súbito soltou-se e saiu correndo do quarto. O marido seguiu-a até a escada e chamou-a enquanto ela corria para baixo. Ele ouviu a corrente chocalhar e a tranca do chão ser puxada lenta e firmemente do lugar. Então a voz da senhora soou, nervosa e ofegante.

– A tranca — gritou ela alto. — Desça que eu não consigo puxar a tranca.

Mas o marido estava de joelhos no chão, procurando a pata desesperadamente. Se pelo menos conseguisse encontrá–la antes que a coisa entrasse. Uma série de batidas reverberou pela casa, e ele ouviu o arrastar de uma cadeira quando a esposa a colocou no corredor encostada na porta. Ouviu o ranger da tranca quando esta se destravou lentamente, e no mesmo momento encontrou a pata de macaco, e desesperadamente fez o terceiro e último pedido.





- Leve-o embora! Desapareça! Faça com que suma para sempre de nossas vidas!

As batidas pararam subitamente, embora ainda ecoassem na casa. Ele ouviu a cadeira ser arrastada de volta, e a porta se abrir. Um vento frio subiu pela escada, e um gemido alto e demorado de decepção e tristeza da esposa lhe deu coragem para correr até ela e depois até o portão. 

O lampião da rua que tremulava do outro lado brilhava numa estrada silenciosa e deserta.


FIM

A Pata do Macaco - W.W. Jacobs (Parte 2)


II


– Eu creio que todos os velhos soldados são iguais — disse a Sra. White. — Essa ideia de dar ouvidos a tal tolice! Como é que se pode realizar desejos hoje em dia? E se fosse possível, como é que iam aparecer 200 libras, papai?
Na claridade do sol de inverno, na manhã seguinte, quando este banhou a mesa do café, ele riu de seus temores. Havia um ar de naturalidade na sala que não existia na noite anterior, e a pequena pata suja estava jogada na mesa de canto com um descuido que não atribuía grande crença a suas virtudes.

– Morris disse que as coisas aconteciam com tanta naturalidade — disse o pai —que a gente podia até achar que era coincidência.– caindo do céu, talvez —disse Herbert, com ar brincalhão.

– Bem, não gaste o dinheiro antes de eu voltar — disse Herbert, ao se levantar da mesa. — Estou com medo de que você se torne um homem mesquinho e avarento, e vamos ter de renegá–lo.

A mãe riu e, acompanhando-o até a porta, viu-o descer a rua. Voltando à mesa do café, divertiu-se à custa da credulidade do marido. O que não a impediu de correr até a porta com a batida do carteiro, nem de se referir a sargentos da reserva com vício de beber, quando descobriu que o correio trouxera uma conta do alfaiate.

– Herbert vai dizer uma das suas gracinhas quando chegar em casa — disse ela, quando se sentaram para jantar.

– Com certeza — disse o Sr. White, servindo-se de cerveja –, mas, apesar de tudo, a coisa se mexeu na minha mão; eu posso jurar.

– Foi impressão — disse a senhora apaziguadoramente.

– Estou dizendo que se mexeu — replicou o outro. — Não há dúvida; eu tinha acabado… O que houve?

A mulher não respondeu. Estava observando os movimentos misteriosos de um homem do lado de fora, que, espiando com indecisão para a casa, parecia estar tentando tomar a decisão de entrar. Lembrando-se das 200 libras, ela reparou que o estranho estava bem–vestido e usava um chapéu de seda novo.

Por três vezes ele parou no portão, e depois caminhou novamente. Da quarta vez ficou com a mão parada sobre ele, e depois com uma súbita resolução abriu-o e entrou. A Sra. White no mesmo momento desamarrou o avental rapidamente, colocando-o debaixo da almofada da cadeira. Convidou o estranho, que parecia deslocado, a entrar. Ele olhou para ela furtivamente, e ouviu preocupado, a senhora desculpar-se pela aparência da sala, e pelo casaco do marido, uma roupa que ele geralmente reservava para o jardim. Então ela esperou, com paciência, que ele falasse do que se tratava, mas, a princípio, ele ficou estranhamente calado.

– Eu… pediram–me para vir aqui — disse ele finalmente, e abaixando-se tirou um pedaço de algodão das calças. — Eu venho representando “Maw&Meggins”.

A senhora sobressaltou-se.

– Aconteceu alguma coisa? — perguntou ela, ofegante — Acontecem alguma coisa a Herbert? O que é? O que é?

O marido interveio.

– Calma, calma, mamãe — disse ele rapidamente. — Sente-se e não tire conclusões precipitadas. O senhor certamente não trouxe más notícias, não é, senhor — e olhou para o outro ansiosamente.

– Eu lamento… — começou o visitante.

– Ele está ferido? — perguntou a mãe desesperada.

O visitante assentiu com a cabeça.

– Muito ferido — disse. — Mas não está mais sofrendo.

– Ah, graças a Deus! — disse a senhora, apertando as mãos. — Graças a Deus! Graças…

Parou de falar de repente quando o significado sinistro da afirmativa se abateu sobre ela, e ela viu a terrível confirmação de seus temores no rosto desviado do outro. Prendeu a respiração e, virando-se para o marido, menos perspicaz, pôs a mão trêmula sobre a dele. Seguiu-se um demorado silêncio.

– Ele foi apanhado pela máquina — repetiu o Sr. White, estonteado. — Ah! sim.

Ficou sentado olhando para a janela e, tomando a mão da esposa entra as suas, apertou-a como tinha vontade de fazer nos velhos tempos de namoro há quase 40 anos.

– Ele era o único que nos restava — disse ele, voltando-se amavelmente para o visitante. — É difícil.

O outro tossiu e, levantando-se, caminhou lentamente até a janela.

– A firma me pediu para transmitir os nossos sinceros pêsames a vocês por sua grande perda — disse ele, sem olhar para trás. — Eu peço que compreendam que sou apenas um empregado da firma e estou apenas obedecendo ordens.

Não houve resposta; o rosto da senhora estava branco, os olhos parados e a respiração inaudível; no rosto do marido havia um olhar que o amigo sargento talvez tivesse na primeira batalha.

– Devo dizer que “Maw&Meggins” estão isentos de toda responsabilidade —continuou o outro. — Eles não têm nenhuma dívida com a família, mas, em consideração aos serviços de seu filho, desejam presenteá–los com uma certa soma como compensação.

O Sr. White largou a mão da esposa e, pondo-se de pé, olhou para o visitante horrorizado. Seus lábios secos pronunciaram as palavras:

– Quanto?

– Duzentas libras — foi a resposta.

Indiferente ao grito da esposa, o velho sorriu fracamente, estendeu as mãos como um homem cego e caiu, desfalecido, no chão.

quinta-feira, 11 de agosto de 2016

A Pata do Macaco - W.W. Jacobs (Parte 1)


A PATA DO MACACO
– W. W. Jacobs –

I


Lá fora, a noite estava fria e úmida, mas na pequena sala de visitas de Labumum Villa os postigos estavam abaixados e o fogo queimava na lareira. Pai e filho jogavam xadrez: o primeiro tinha ideias sobre o jogo que envolviam mudanças radicais, colocando o rei em perigo tão desnecessário que até provocava comentários da velha senhora de cabelos brancos, que tricotava serenamente perto do fogo.
– Ouça o vento — disse o Sr. White, que, tendo visto tarde demais um erro fatal, queria evitar que o filho o visse.
– Estou escutando — disse o último, estudando o tabuleiro ao esticar a mão.
– Xeque.
– Eu duvido que ele venha hoje à noite — disse o pai, com a mão parada em cima do tabuleiro.
– Mate — replicou o filho.
– Essa é a desvantagem de se viver tão afastado — vociferou o Sr. White, com um a violência súbita e inesperada. — De todos os lugares desertos e lamacentos para se viver, este é o pior. O caminho é um atoleiro, e a estrada uma torrente. Não sei o que as pessoas têm na cabeça. Acho que, como só sobraram duas casas na estrada, elas acham que não faz mal.
– Não se preocupe, querido — disse a esposa em tom apaziguador. — Talvez você ganhe a próxima partida.
O Sr. White levantou os olhos bruscamente a tempo de perceber uma troca de olhares entre mãe e filho. As palavras morreram em seus lábios, e ele escondeu um sorriso de culpa atrás da barba fina e grisalha.
– Aí vem ele — disse Herbert White, quando o portão bateu ruidosamente e passos pesados se aproximaram da porta.
O velho levantou-se com uma pressa hospitaleira e, ao abrir a porta, foi ouvido cumprimentando o recém chegado. Este também o cumprimentou, e a Sra. White tossiu ligeiramente quando o marido entrou na sala, seguido por um homem alto e corpulento, com olhos pequenos e nariz vermelho.
– Sargento Morris — disse ele, apresentando-o.
O sargento apertou as mãos e, sentando-se no lugar que lhe ofereceram perto do fogo, observou satisfeito o anfitrião pegar uísque e copos, e colocar uma pequena chaleira de cobre no fogo.
Depois do terceiro copo, seus olhos ficaram mais brilhantes, e ele começou a falar, o pequeno círculo familiar olhando com interessante este visitante de lugares distantes, quando ele empertigou os ombros largos na cadeira e falou de cenários selvagens e feitos intrépidos: de guerras, pragas e povos estranhos.
– Vinte e um anos nessa vida — disse o Sr. White, olhando para a esposa e o filho. — Quando ele foi embora era um rapazinho no armazém. Agora olhem só para ele.
– Ele não parece ter sofrido muitos reveses — disse a Sra. White amavelmente.
– Eu gostaria de ir à Índia — disse o velho — só para conhecer, compreende?
– Você está bem melhor aqui — disse o sargento, sacudindo a cabeça. Pôs o copo vazio na mesa e, suspirando baixinho, sacudiu a cabeça novamente.
– Eu gostaria de ver aqueles velhos templos, os faquires e os nativos — disse o velho. — O que foi que você começou a me contar outro dia sobre uma pata de macaco ou algo assim, Morris?
– Nada — disse o soldado rapidamente. — Não é nada de importante.
– Pata de macaco? — perguntou a Sra. White, curiosa.
– Bem, é só um pouco do que se poderia chamar de magia, talvez — disse o sargento com falso ar distraído.
Os três ouvintes debruçaram-se nas cadeiras interessados. O visitante levou o copo vazio à boca distraidamente e depois recolocou-o onde estava. O dono da casa tornou a enchê–lo.
– Aparentemente — disse o sargento, mexendo no bolso — é só uma patinha comum dissecada.
Tirou uma coisa do bolso e mostrou-a. A Sra. White recuou com uma careta, mas o filho, pegando-a, examinou-a com curiosidade.
– E o que há de especial nela? — perguntou o Sr. White ao pegá–la da mão do filho e, depois de examiná–la, colocá–la sobre a mesa.
– Foi encantada por um velho faquir — disse o sargento –, um homem muito santo. Ele queria provar que o destino regia a vida das pessoas, e que aqueles que interferissem nele seriam castigados. Fez um encantamento pelo qual três homens distintos poderiam fazer, cada um, três pedidos a ela.
A maneira dele ao dizer isso foi tão solene que os ouvintes perceberam que suas risadas estavam um pouco fora de propósito.
– Bem, por que não faz os seus três pedidos, senhor? — disse Herbert White astutamente.
O soldado olhou para ele como olham as pessoas de meia–idade para um jovem presunçoso.

– Eu fiz — disse ele calmamente, e seu rosto marcado empalideceu.
– E teve mesmo os três desejos satisfeitos? — perguntou a Sra. White.
– Tive — disse o sargento, e o copo bateu nos dentes fortes.
– E alguém mais fez os pedidos? — insistiu a senhora.
– O primeiro homem realizou os três desejos — foi a resposta. — Eu não sei quais foram os dois primeiros, mas o terceiro foi a morte. Por isso é que consegui a pata.
Seu tom de voz era tão grave que o grupo ficou em silêncio.
– Se você conseguiu realizar os três desejos, ela não serve mais para você Morris — disse o velho finalmente. — Para que você guarda essa pata?
O soldado meneou a cabeça.
– Por capricho, suponho — disse lentamente. — Cheguei a pensar em vendê–la, mas acho que não o farei. Ela já causou muitas desgraças. Além disso, as pessoas não vão comprar. Acham que é um conto de fadas, algumas delas; e as que acreditam querem tentar primeiro para pagar depois.
– Se você pudesse fazer mais três pedidos — disse o velho, olhando para ele atentamente –, você os faria?
– Eu não sei — disse o outro. — Eu não sei.
Pegou a pata e, balançando-a entre os dedos, de repente jogou-a no fogo.
White, com um ligeiro grito, abaixou-se e tirou-a de lá.
– É melhor deixar que ela se queime — disse o soldado solenemente.
– Se você não quer mais, Morris — disse o outro –, me dá.
– Não — disse o amigo obstinadamente. — Eu a joguei no fogo. Se você ficar com ela, não me culpe pelo que acontecer. Jogue isso no fogo outra vez, como um homem sensato.
O outro sacudiu a cabeça e examinou sua nova aquisição atentamente.
– Como você faz para pedir? — perguntou.
– Segure a pata na mão direita e faça o pedido em voz alta, — disse o sargento– mas eu o advirto sobre as consequências.
– Parece um conto das Mil e uma noites — disse a Sra. White, ao se levantar e começar a pôr o jantar na mesa. – Você não acha que deveria pedir quatro pares de mão para mim?
– Se quer fazer um pedido — disse ele asperamente –, peça algo sensato.

O Sr. White colocou a pata no bolso novamente e, arrumando as cadeiras acenou para que o amigo fosse para a mesa. Durante o jantar o talismã foi parcialmente esquecido, e depois os três ficaram escutando, fascinados, um segundo capítulo das aventuras do soldado na Índia.
– Se a história sobre a pata de macaco não for mais verdadeira do que as que nos contou — disse Herbert, quando a porta se fechou atrás do convidado, que partiu a tempo de pegar o último trem–, nós não devemos dar muito crédito a ela.
– Você deu alguma coisa a ele por ela, papai? — perguntou a Sra. White, olhando para o marido atentamente.
– Pouca coisa — disse ele, corando ligeiramente. — Ele não queria aceitar, mas eu o fiz aceitar. E ele tornou a insistir que eu jogasse fora.
– É claro — disse Herbert, fingindo estar horrorizado. — Ora, nós vamos ser ricos, famosos e felizes. Peça para ser um imperador, papai, para começar, então você não vai ser mais dominado pela mulher.
Ele correu em volta da mesa, perseguido pela Sra. White armada com uma capa de poltrona.
O Sr. White tirou a pata do bolso e olhou para ela dubiamente.
– Eu não sei o que pedir, é um fato — disse lentamente. — Eu acho que tenho tudo o que quero.
– Se você acabasse de pagar a casa ficaria bem feliz, não ficaria? — disse Herbert, com a mão no ombro dele. — Bem, peça 200 libras, então, isso dá.
O pai, sorrindo envergonhado pela própria ingenuidade, segurou o talismã, quando o filho, com uma cara solene, um tanto franzida por uma piscadela de olhos para a mãe, sentou-se no piano e tocou alguns acordes para fazer fundo.
– Eu desejo 200 libras — disse o velho distintamente.
Um rangido do piano seguiu-se às palavras, interrompido por um grito estridente do velho. A mulher e o filho correram até ele.
– Ela se mexeu — gritou ele, com um olhar de nojo para o objeto caído no chão.— Quando eu fiz o pedido, ela se contorceu na minha mão como uma cobra.
– Bem, eu não vejo o dinheiro — disse o filho ao pegá–la e colocá–la em cima da mesa — e aposto que nunca vou ver.
– Deve ter sido imaginação sua, papai — disse a esposa, olhando para ele ansiosamente.
Ele sacudiu a cabeça.
– Não faz mal, não aconteceu nada, mas a coisa me deu um susto assim mesmo.
Eles se sentaram perto do fogo novamente enquanto os dois homens acabavam de fumar cachimbos. Lá fora, o vento zunia mais do que nunca, e o velho teve um sobressalto com o barulho de uma porta batendo no andar de cima. Um silêncio estranho e opressivo abateu-se sobre todos os três, e perdurou até o velho casal se levantar e ir dormir.
– Eu espero que vocês encontrem o dinheiro dentro de um grande saco no meio da cama — disse Herbert, ao lhes desejar boa noite — e algo terrível agachado em cima do armário observando vocês guardarem seu dinheiro maldito.

Ficou sentado sozinho na escuridão, olhando para o fogo baixo e vendo caras nele. A última cara foi tão feia e tão simiesca que ele olhou para ela assombrado. A cara ficou tão vivida que, com uma risada inquieta, ele procurou um copo na mesa que tivesse um pouco de água para jogar no fogo. Sua mão pegou na pata de macaco, e com um ligeiro estremecimento ele limpou a mão no casaco e foi dormir.

(Continua)